Cibersegurança & satélite

O Futuro da Comunicação por Satélite: Comunicação Óptica e Lasers. É Seguro?

 

Sobre a Autora
Angelina Tsuboi é desenvolvedora de software e instrutora de cibersegurança aeroespacial, com foco em sistemas de satélites. Com mais de uma década de experiência em programação e desenvolvimento, além de trabalhar como pesquisadora científica na NASA, Angelina participou de diversas iniciativas de segurança voltadas para o setor aeroespacial, abrangendo drones, aeronaves e satélites.


Movida por sua paixão pelo ensino, Angelina se alegra em simplificar assuntos complexos como aeroespacial, cibersegurança e programação para capacitar seus alunos. Ela visa garantir que seus estudantes possam aplicar prontamente as habilidades adquiridas em seus projetos profissionais e pessoais. Angelina é fundadora da Stellaryx Labs (stellaryxlabs.com), uma empresa de consultoria, educação e serviços de desenvolvimento no nexus de software, segurança e aeroespacial. Para saber mais sobre seu trabalho, visite seu site: angelinatsuboi.com.

 

Introdução
Em uma era em que a comunicação via satélite é essencial para grandes aplicações comerciais, como conectividade global à internet, observação da Terra e telecomunicações, a segurança se torna primordial. Com a crescente dependência de redes de satélites para facilitar a comunicação e transmissão de dados críticos em todo o mundo, assegurar a confidencialidade, integridade e disponibilidade dos sistemas de comunicação por satélite é fundamental. À medida que a tecnologia avança, o surgimento de satélites de comunicação óptica representa um avanço significativo na tecnologia de comunicação espacial. Isso oferece velocidade, capacidade e segurança sem precedentes para redes de comunicação por satélite.

 

Fundamentos da Comunicação por Satélite

Satélites de comunicação são utilizados para transmitir dados a longas distâncias, onde a infraestrutura de comunicação terrestre ou cabeada não pode transmitir o sinal devido a obstáculos terrestres e atmosféricos, como montanhas, edifícios, fenômenos meteorológicos como tempestades e interferência eletromagnética.

De forma rudimentar, um sistema de comunicação por satélite pode ser dividido na seguinte sequência:

  1. Um sinal de rádio contendo informações é transmitido de uma estação terrestre para um satélite.
  2. O satélite recebe o sinal, amplifica-o e o retransmite em outra frequência para ser recebido por outra estação terrestre.
  3. O sinal é recebido e processado pela outra estação terrestre.

 

Imagem fornecida por Inmarsat

 

Há outra forma de comunicação por satélite chamada comunicação inter-satélites, também conhecida como “crosslinking”, onde sinais são transmitidos de satélite para satélite dentro da órbita. Os links de comunicação inter-satélites seguem uma sequência de transmissão semelhante:

  1. Um sinal de rádio é transmitido do transmissor ou antena de um satélite em direção ao equipamento receptor de outro satélite dentro de sua órbita.
  2. O sinal viaja pelo espaço.
  3. O sinal é recebido pelo receptor do satélite de destino e processado pelo computador de bordo.

 

Espectro de Rádio e Alocação de Bandas de Frequência
Para otimizar a comunicação, os satélites utilizam bandas de frequência para dividir os serviços com base em suas aplicações. Por exemplo, serviços de televisão por satélite geralmente operam em bandas de frequência diferentes dos serviços de internet por satélite. Isso evita interferências e garante desempenho confiável.

A designação de uma constelação de satélites a uma banda de frequência específica depende de sua funcionalidade. Frequências mais altas são normalmente reservadas para operações que exigem alta capacidade de dados, como comunicações de internet de alta velocidade, enquanto frequências mais baixas são alocadas para serviços mais amplos, como transmissão de televisão e rádio astronômico.


A UIT (União Internacional de Telecomunicações) é o designador global das bandas de frequência para sistemas de satélite. As bandas incluem L (1.518-1.675 GHz), S (1.97 – 2.69 GHz), C (3.4GHz – 7.025 GHz), X (7.25 – 8.44 GHz), Ku (10.7 – 14.5 GHz), Ka (17.3 – 30 GHz), e Q/V (37.5 – 51.4 GHz).

 

Imagem fornecida por ESA

 

Modulação e Segurança Tradicional de Radiofrequência
A alocação de bandas de frequência dentro do espectro de rádio serve como uma estrutura básica para organizar os sinais de comunicação, que são otimizados por meio de técnicas de modulação e codificação.
Modulação é o processo no qual características das ondas de rádio, como fase (posição de uma onda em relação a um ponto de referência), frequência (número de ciclos de uma onda) e amplitude (intensidade de uma onda), são alteradas junto com os dados de banda base (por exemplo, áudio, vídeo etc).


Há múltiplas técnicas de modulação de sinal, incluindo:

  • Analog Modulation (Modulação Analógica): método mais simples de modulação, que envolve modular uma onda portadora usando um sinal analógico. Existem três métodos principais de modulação analógica:
  • Amplitude Modulation – AM (Modulação de Amplitude) : a amplitude de uma onda portadora é variada em proporção à amplitude do sinal de entrada.
  • Frequency Modulation – FM (Modulação de Frequência): a frequência de uma onda portadora é alterada de acordo com a amplitude do sinal de entrada.
  • Phase Modulation – PM (Modulação de Fase): a fase de uma onda portadora muda em resposta às variações na amplitude do sinal de entrada.

 

Imagem fornecida por fmuser

 

  • Digital Modulation (Modulação Digital): semelhante à modulação analógica, mas os parâmetros da portadora, como fase, frequência e amplitude, são ajustados em resposta aos sinais de informação digital.

Além das três técnicas básicas de modulação, existem muitas variantes, como:

  • Quadrature Amplitude Modulation – QAM (Modulação por Amplitude em Quadratura): um híbrido de modulação de amplitude e fase.
  • Quadrature Phase Shift Keying – QPSK (Chaveamento por Deslocamento de Fase em Quadratura): varia apenas a fase do sinal, permitindo maior taxa de transferência de dados.
  • Orthogonal Frequency Division Multiplexing – OFDM (Multiplexação por Divisão de Frequência Ortogonal): método que segmenta os dados digitais em subfluxos menores para transmitir em frequências portadoras separadas, otimizando a eficiência espectral.

 

 

Imagem fornecida por ensatellite

 

Técnicas eficazes de codificação complementam os esquemas de modulação, melhorando a confiabilidade e a integridade dos dados transmitidos. Existem dois principais tipos de esquemas de codificação:

  • Block Codes (Códigos de Bloco): informações são segmentadas em blocos de tamanho fixo, e bits extras são adicionados conforme um algoritmo.
  • Convolutional Codes (Códigos Convolucionais): informações são processadas em fluxo contínuo, e bits adicionais são adicionados a bits anteriores.

A codificação desempenha um papel fundamental na verificação de erros nas transmissões via satélite. Sinais de satélite são frequentemente prejudicados por várias perturbações atmosféricas e ambientais (fatores que impedem ou obscurecem um sinal de satélite, o que pode causar erros aleatórios de bits durante a transmissão de dados). A codificação de erros é um método para garantir que os dados transferidos não sejam alterados de sua origem até o destino.

Um esquema de codificação popular utilizado especificamente para verificação de erros é o CRC (Cyclic Redundancy Check), que opera gerando um checksum (uma sequência curta de bits anexada ao final dos dados antes da transmissão). Quando os dados são transmitidos, o CRC é aplicado novamente no receptor para garantir que os dois checksums calculados correspondam, indicando que os dados foram recebidos sem erro.

 

 

Imagem fornecida por Science Direct

 

Além da modulação e codificação, outras medidas de segurança de rádio frequência são implementadas para fortalecer ainda mais a segurança das transmissões. Algumas técnicas incluem:

  • Frequency Hopping (Salto de Frequência): Esta técnica envolve a troca rápida da frequência portadora do sinal transmitido por um conjunto predefinido de frequências estabelecidas por um algoritmo, dificultando que invasores interceptem ou interfiram nas comunicações.
  • Spread Spectrum (Espalhamento de Espectro): O espalhamento de espectro envolve a dispersão do sinal por uma ampla faixa de frequência, modulando o sinal usando um código de espalhamento (sequência pseudorrandômica de bits). O receptor pode então “desespelhar” o sinal recebido para recuperar os dados originais. Esse método dificulta a tentativa de hackers de coordenarem ataques de bloqueio de banda estreita devido à emissão de sinal de banda larga.

 

Desvantagens das Comunicações Tradicionais de Rádio por Satélite

Embora as ondas de rádio constituam a espinha dorsal da maioria das tecnologias de comunicação via satélite, elas apresentam desvantagens, como a degradação do sinal, atraso de propagação, largura de banda limitada e vulnerabilidade a ataques baseados em solo.

As ondas de rádio para comunicação via satélite precisam percorrer uma longa distância. Isso resulta em um fenômeno chamado atraso de propagação, onde o sinal sofre problemas de latência (tempo de atraso para um sistema de satélite). Isso ocorre em conjunto com a degradação do sinal, resultante de atenuação, dispersão e efeitos de múltiplos caminhos à medida que as ondas de RF viajam pelo espaço. Infelizmente, isso pode levar a mais erros e à redução da capacidade de comunicação. O espectro de RF disponível para uso de tecnologias de satélite também é finito, o que leva a repercussões de capacidade para a largura de banda disponível.

Além disso, as comunicações focadas em RF são vulneráveis a uma ampla gama de ameaças à segurança. Isso inclui interferência, spoofing e escuta clandestina, devido às características inerentes aos sinais de rádio frequência, como sua suscetibilidade à interceptação, manipulação e interferência.

  • Jamming (Interferência): A interrupção intencional das comunicações via satélite, transmitindo sinais de interferência nas mesmas bandas de frequência usadas para a comunicação.
  • Spoofing: A transmissão não autorizada de sinais falsos para se passar por fontes legítimas de comunicação via satélite.
  • Eavesdropping (Escuta clandestina): A interceptação de comunicações via satélite por partes não autorizadas.

 

Links Ópticos para Comunicações via Satélite

Para melhorar a velocidade e a capacidade dos sistemas de comunicação via satélite, está sendo desenvolvida uma comunicação óptica com lasers. Em comparação com as ondas de rádio tradicionais, as comunicações ópticas permitem taxas de dados e capacidades significativamente maiores, ao mesmo tempo que mitigam a interferência de rádio. Além disso, as antenas ópticas possuem uma forma mais compacta em comparação com as antenas de rádio, permitindo a redução dos custos de lançamento e o uso mais eficiente do espaço nos satélites.

As comunicações ópticas operam dentro do espectro óptico, que é uma faixa de comprimentos de onda eletromagnéticos tipicamente entre 390 a 700 nanômetros. Elas abrangem a luz visível e a radiação infravermelha próxima.

 

Imagem fornecida por NASA

 

Satélites que utilizam a banda óptica para comunicação possuem transceptores ópticos a bordo. Estes convertem sinais elétricos que carregam informações em sinais ópticos, como lasers, para serem transmitidos através do espaço livre. Os transceptores ópticos nos satélites são compostos pelos seguintes componentes:

  • Lasers: Transmitem sinais ópticos que transportam dados, emitindo feixes de luz altamente focados.
  • Fotodetectores: Recebem os sinais ópticos transmitidos pelos lasers, convertendo-os em saídas de sinais elétricos.
  • Moduladores: Codificam informações em um sinal óptico a ser transmitido.
  • Demoduladores: Extraem as informações dentro de um sinal óptico recebido.

 

Imagem fornecida por glsun

 

Exemplos de Infraestrutura de Link a Laser:

Nos últimos anos, várias iniciativas foram voltadas para aproveitar as comunicações a laser para satélites, com projetos notáveis realizados por organizações como a NASA, a Agência Espacial Europeia (ESA) e a SpaceX. Internacionalmente, o cronograma de implementação de sistemas fotônicos em infraestrutura espacial se estende de 2023 a 2026, destacando um esforço concentrado para aprimorar as capacidades e a eficiência das redes de comunicação via satélite. Alguns importantes projetos de comunicação óptica incluem:

  • Demonstração de Retransmissão de Comunicações a Laser (LCRD): Uma demonstração de retransmissão a laser em órbita terrestre baixa, iniciada em 2021 pela NASA, que conseguiu transmitir 1,244 Gbps de dados entre duas estações terrestres.
  • Entrega Infravermelha Terabyte (TBIRD): Uma estação terrestre óptica desenvolvida em 2022, usando componentes comerciais prontos para uso (COTS). Oferece uma redução significativa em tamanho, peso e potência (SWAP) e possui velocidades de transferência de dados de 100 Gbps.
  • Discovery Psyche: O mais recente dos três experimentos de comunicação óptica espacial liderados pela NASA. O projeto é um link óptico em espaço profundo, com uma estação terrestre óptica de 5 metros e velocidades de terminal de usuário em toImagem fornecida pelaImagem fornecida pelaImagem fornecida pelarno de 125 Mbps.

 

Estação Óptica Terrestre da ESA: Esta estação óptica terrestre experimental é usada para pesquisar comunicações espaciais avançadas, análise de detritos espaciais e experimentos com comunicação quântica.

 

Imagem fornecida por ESA

 

Cibersegurança para Infraestrutura de Link a Laser para Satélites

Embora haja uma infinidade de benefícios que surgem da migração para a infraestrutura de comunicações baseadas em óptica, ela ainda apresenta algumas desvantagens. Primeiramente, as comunicações ópticas dependem de alta precisão, já que a informação é enviada por um feixe estreito apontado para o receptor. Isso reduz significativamente a margem de erro, pois mesmo um pequeno desvio do feixe pode resultar na interrupção do sinal. Além disso, os sinais ópticos são altamente vulneráveis à interferência de emissões de luz externas, de várias fontes, como o sol e outros sinais ópticos. Ambos os fatores tornam as comunicações ópticas vulneráveis à interceptação, spoofing, interferência e ataques físicos.

Para mitigar os vetores de ameaça listados, será necessário implementar mecanismos de criptografia para os links de comunicação a laser em satélites. Ao criptografar os links de comunicação a laser em satélites, as informações sensíveis transmitidas entre espaçonaves e estações terrestres são protegidas contra interceptação, spoofing e outras ameaças cibernéticas. A criptografia ajuda a evitar a escuta clandestina em canais de comunicação, frustra tentativas de manipulação ou falsificação de dados e reduz o risco de acesso não autorizado a sistemas críticos.

 

Futuro da Segurança de Links a Laser
A criptografia totalmente óptica para satélites abre portas para muitas tecnologias revolucionárias, incluindo a Distribuição de Chaves Quânticas (QKD). O QKD aproveita os princípios da mecânica quântica para estabelecer chaves de criptografia seguras entre duas partes, explorando as propriedades dos estados quânticos. Em um ambiente de QKD, sinais quânticos são transmitidos de e para o remetente e o receptor via fótons. Qualquer tentativa de escuta clandestina desses sinais resultará em estados quânticos perturbados, o que por sua vez, indica uma violação de segurança. 

No geral, a utilização do espectro óptico para transmitir sinais de satélite prova ser o próximo passo promissor na tecnologia de comunicações via satélite e possui um imenso potencial para revolucionar as redes de comunicação baseadas no espaço. Com sua capacidade de oferecer taxas de dados mais altas, redução de interferência de sinais e segurança aprimorada, os satélites de comunicação óptica abrem caminho para uma comunicação mais eficiente e confiável no espaço. À medida que os avanços na tecnologia de comunicação óptica continuam, podemos antecipar melhorias adicionais na conectividade via satélite. Isso permitirá novas oportunidades para exploração científica, observação da Terra, telecomunicações e muito mais.

 

Referências

  1. G. Manning, “Optical Communications – NASA,” NASA, Sep. 29, 2023. https://www.nasa.gov/technology/space-comms/optical-communications-overview/#:~:text=Within%20the%20context%20of%20NASA,to%20send%20and%20receive%20information.

“Optical inter-satellite communication technology for High-Speed, Large-Capacity data communications,” NEChttps://www.nec.com/en/global/techrep/journal/g21/n01/210131.html

  1. Murphy, “What’s next: the future of NASA’s laser communications – NASA,” NASA, Aug. 04, 2023. https://www.nasa.gov/directorates/somd/space-communications-navigation-program/whats-next-the-future-of-nasas-laser-communications/

 

Este artigo é uma tradução de: https://hakin9.org/the-future-of-satellite-communication-optical-communication-and-lasers-is-it-secure/